” – Se tivesse poder para isso, todo idiota que saísse por aí dizendo Feliz Natal seria assado com seu pudim e enterrado com um ramo no coração!” (Ebenezer Scrooge)
Após ser amplamente reconhecido por realizar obras grandiosas como a trilogia ‘De Volta para o Futuro’ e após alguns filmes mal recebidos pelo público, Robert Zemeckis, sentindo a necessidade de renovação, voltou alguns anos depois com o excepcional ‘O Expresso Polar’, no qual adotou a técnica do motion capture - adotando como seu método preferido de produção. Desde então, lançou o ótimo “A Lenda de Beowulf” e retornou com este igualmente admirável “Os Fantasmas de Scrooge”, em 2009.
Para esse filme, Zemeckis não poderia ter escolhido um elenco melhor: mais uma vez interpretando uma criatura avessa às celebrações que passa por experiências capazes de mudar seu temperamento (como em O Grinch), Jim Carrey assume o clássico personagem Ebenezer Scrooge, criado por Charles Dickens em seu moralista, mas memorável Um Conto de Natal, de 1843: amargo, mesquinho e cruel, Scrooge maltrata seu fiel funcionário Bob (Oldman), ignora seu sobrinho Fred (Firth) e se nega a ceder um centavo de sua imensa fortuna à caridade. É então que o fantasma de seu falecido sócio Marley (Oldman novamente) o visita para informá-lo de que será contatado por três espíritos: os dos Natais Passados, do Presente e Futuros – e que esta será a última chance do milionário redimir-se e evitar um castigo temível depois de sua morte.
Se há algo que o diretor sabe fazer é explorar as inúmeras possibilidades que a tecnologia pode lhe proporcionar. A escolha por tal técnica não foi por acaso. Se o longa fosse realizado por atores verdadeiros, seria necessário muito esforço por parte dos efeitos especiais para fazer de “Os Fantasmas de Scrooge” um filme no mínimo bem feito. Por outro lado, se fosse uma animação comum, a película extrapolaria demais os limites da realidade humana, e a simples aparição de um fantasma - presença essencial para o longa - seria extremamente irrelevante. Com isso, a escolha pela captação do movimento de pessoas reais permitiu ao diretor poder adicionar o mágico e o irreal na trama e ainda assim continuar impressionando o público.
A obra possui uma estrutura muito comum e é isso que pode prejudicar um pouco o resultado geral do filme e a experiência de quem assiste. Por mais que o desfecho não possa e não deva ser diferente, ele é evidente (até demais). O formato “desamor”, “ensinamentos” e “arrependimento” é seguida à risca, deixando ‘Os fantasmas de Scrooge’ bastante didático. Desse modo, se o primeiro terço fosse prolongado e fosse dada devida atenção à solidão do personagem principal, a conclusão da história seria bem sucedida e faria mais sentido, podendo chegar até a emocionar, o que não acontece aqui. Assinado pelo próprio Zemeckis, o roteiro também peca ao construir personagens muito maniqueístas, em que o mal é personificado por Scrooge e o bem por todos os outros.
Entretanto, o enredo traz uma grande surpresa perto da metade do filme. À medida que Scrooge conhece os fantasmas, eles vão se tornando cada vez mais assustadores. O primeiro, o do natal passado, é bondoso, possuindo características que emanam compaixão pelo protagonista: sua voz, extremamente calma e seus movimentos nunca bruscos. O segundo, espírito do natal presente, segue aparentemente pelo mesmo caminho, até que risadas sarcásticas e desconcertantes revelam sua verdadeira natureza, seguindo uma linha de ensinamentos mais sombria e adulta. Já o espírito do natal futuro é ainda mais apavorante. Retratado apenas por meio de uma gigante sombra, ele não hesita em colocar uma enorme carruagem à caça de Scrooge conduzindo-o ao cemitério. Diante disso, o filme ganha pontos surpreendentes devido a essas cenas, mas pode incomodar algumas crianças e seus pais, que esperavam um filme bem mais leve.
Nesse sentido, outra característica positiva da obra é o humor inserido na história. Há, de fato, pouco espaço para risadas, afinal estamos diante de um conto dramático e reflexivo. Entretanto, a comicidade é inserida através de cenas macabras, como quando o espírito de Marley quebra o maxilar ao falar com o amigo Scrooge. Cenas como essa ao longo do filme também demonstram que o roteirista sabe tirar bom humor de fatos sombrios. Afinal, seria no mínimo estranho um filme protagonizado por Jim Carrey - que interpreta no total sete personagens - sem algumas gargalhadas.
Assim, apesar de não ter um público alvo definido, “Os Fantasmas de Scrooge” vale pelo visual arrebatador e pela ótima direção. Robert Zemeckis conta mais uma história de Natal com muita magia e sarcasmo, utilizando-se dessa vez do talento de Jim Carrey em diversos papéis no filme. Um conto que já foi reinterpretado através de diversas obras audiovisuais mas que, certamente, merece a sua atenção no modo como é abordado nessa animação em específico.
Nota do Crítico: 4.0/5.0 (Ótimo filme)