“É apenas um número.”- James Bond.
Poucas franquias são tão bem estabelecidas no cinema quanto 007. Desde a sua criação, James Bond sempre personificou esse ideal do que é ser homem: alguém que nunca perde a classe e que está sempre rodeado de mulheres e carros equipados. Contudo, Daniel Craig, por ser o ator que mais tempo o interpretou - quinze anos desde o lançamento de “Cassino Royale”, em 2006 - carrega em seu 5° e último filme um tom de despedida por todo o ciclo em que ajudou a ressignificar o personagem para as telonas.
O longa nos apresenta um James Bond aposentado da vida de agente, vivendo tranquilamente na Jamaica. Entretanto, sua paz é interrompida quando um velho amigo, Felix Leiter, que trabalha na CIA, pede sua ajuda. A missão de resgatar um cientista sequestrado acaba sendo muito mais traiçoeira do que o esperado, o que coloca Bond na trilha de um novo vilão armado com uma perigosa tecnologia, vivido por Rami Malek.
Diante da grande expectativa criada em torno do filme - tanto pelo adiamento devido a pandemia quanto por ser a obra que prometia o devido desfecho do personagem - “Sem tempo para morrer” aposta em seguir o caminho do sentimentalismo e manter a ação em segundo plano. Dessa forma, as cenas mais dinâmicas ficam um tanto espaçadas, deixando o enredo dramático tomar a dianteira e, naturalmente, distancia o espectador de desfrutar uma narrativa tão enérgica. O sentimento que paira sobre os fãs da franquia pode ser bastante divisivo e talvez seja o longa de maior contradição, quando comparado a outros filmes da era Craig, porém, não é uma obra mal produzida, pelo contrário, entrega cenas de perseguição e combate muito bem desenvolvidas.
Nesse sentido, vale destacar também que a proposta do filme pode desagradar o público ao tentar desenvolver o arco de antagonistas. O diretor Joji Fukunaga havia prometido que Safin seria o vilão mais inteligente e poderoso de toda a franquia, entretanto, o que se concretiza é o acúmulo de decisões questionáveis aliadas a uma boa tecnologia. De fato, nem todos os filmes dessa série foram bons, no entanto, o embate entre Bond e o vilão sempre era satisfatório. Dito isso, o roteiro, escrito por Neal Purvis e Robert Wade, não explora e não constrói o vilão de Rami Malek devidamente, além de não sustentar a premissa da superinteligência do personagem - questão que foi amplamente divulgada nas campanhas do longa - encerrando com saldo negativo e desperdiçando o potencial do ator.
Ademais, é indispensável salientar o trabalho da trilha sonora do novo 007, composta por Hans Zimmer, com trabalho original de Billie Eilish. Podemos notar que há uma transição para uma carga dramática mais alta, principalmente no desfecho do longa, e denota uma construção fantástica dos compositores. Além disso, ele presenteia os fãs da franquia ao referenciar inúmeras faixas dos filmes anteriores, reacendendo ares nostálgicos.
Outro ponto satisfatório é a ideia de que os produtores da franquia entenderam que o velho James Bond não se encaixa mais no mundo moderno, sendo preciso encarar os novos tempos e se abrir à renovação para poder seguir em frente. Nesse contexto é introduzida a personagem Nomi, interpretada por Lashana Lynch: ela representa bem essa nova fase a que Bond não pertence - baseando-se no charme próprio e não na ideia de sedução que sempre vimos - evidenciando que será um triste desperdício caso a franquia não a desenvolva no futuro.
No geral, “007- Sem tempo para morrer” é um longa que, na primeira hora de duração, acaba seguindo a fórmula do clássico James Bond, mas acaba desperdiçando tudo isso ao passo que a trama se desenvolve. Entretanto, tornou-se a primeira era de filmes do espião a ter um começo, meio e fim. Talvez um encerramento não tão digno quanto Daniel Craig merecia receber, mas que acena para o novo. Assim, torcemos para que esse seja o começo de um ciclo a que seu roteiro tanto faz alusão.
Nota do Crítico: 3.5/5.0 (Bom)